A complexidade da aplicação da multa por agravo interno (artigo 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil)
Dentro do intrincado contexto do sistema judiciário brasileiro, a interpretação e aplicação do artigo 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, que trata da multa por agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente, têm sido objeto de acirrados debates e análises aprofundadas nos Tribunais Superiores, especialmente no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Recentemente, o STJ, por meio de sua Corte Especial, selecionou um conjunto de Recursos Especiais (nºs 2.043.826, 2.043.887, 2.044.143 e 2.006.910) para análise sob o procedimento dos repetitivos, com o objetivo de estabelecer orientações claras e uniformes sobre a aplicação da penalidade em questão.
O tema submetido a julgamento, registrado como Tema nº 1.201 na base de dados do Colendo Superior Tribunal Justiça, aborda a:
“aplicabilidade da multa prevista no parágrafo 4º do artigo 1.021 do Código de Processo Civil (CPC) quando o acórdão recorrido fundamenta-se em precedente qualificado (artigo 927, III, do CPC).”[Questão submetida a julgamento]
Bem como a:
“possibilidade de considerar manifestamente inadmissível ou improcedente (mesmo em votação unânime) o agravo interno cujas razões apontam para a indevida ou incorreta aplicação de tese firmada em sede de precedente qualificado”. [Questão submetida a julgamento]
Essa medida foi adotada como resposta à complexidade do tema, especialmente considerando que diferentes colegiados têm adotado interpretações variadas em relação à imposição da multa ao longo dos anos.
O Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, tem consolidado o entendimento de que a utilização indevida dos recursos, principalmente quando empregados de forma protelatória ou manifestamente inadmissível, caracteriza abuso do direito de recorrer, justificando, assim, a aplicação da penalidade prevista no Código de Processo Civil:
“A utilização indevida das espécies recursais, materializada na interposição de recursos manifestamente inadmissíveis, improcedentes ou contrários à jurisprudência desta Suprema Corte como mero expediente protelatório, desvirtua o próprio postulado constitucional da ampla defesa e configura abuso do direito de recorrer, ensejando a aplicação da penalidade prevista no art. 1021, § 4º, do CPC, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa.” [ARE 961763 AgR/SP].
Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reforçado que a aplicação da multa não é automática, demandando uma análise meticulosa e fundamentada. É imperativo verificar se o agravo interno é verdadeiramente improcedente de maneira tão evidente que sua interposição possa ser considerada abusiva ou protelatória:
“A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não sendo uma mera consequência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime. A imposição da referida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, requer que o agravo interno se revele manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja tão flagrante que a simples interposição do recurso possa ser considerada, de imediato, como abusiva ou protelatória, o que, contudo, não ocorreu no caso em questão.” [AgInt nos EREsp 1120356/RS].
Além disso, recentes decisões da Terceira Turma do STJ e da Subseção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm enfatizado a importância de considerar o contexto e a fundamentação específica de cada caso antes de impor tal penalidade:
“A aplicação da penalidade não é uma mera decorrência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime.” [AREsp 1.616.329/SP].
“O julgador, ao aplicar a multa, deve levar em consideração o teor das alegações da parte e da matéria recursal apresentada(…) Não é suficiente afirmar a improcedência, aplicando a multa de forma automática, sem elucidar as razões pelas quais, ao interpor o recurso, a parte agiu de maneira abusiva ou protelatória.” [E-Ag-AIRR-101425-23.2016].
A divergência de entendimentos entre os tribunais reflete diretamente na prática jurídica, criando um cenário de incerteza para advogados e litigantes. A aplicação da multa pode variar significativamente dependendo do tribunal e do colegiado responsável pelo julgamento, gerando uma expectativa constante sobre qual direção será seguida em cada caso específico.
Em resumo, a aplicação da multa por agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente é um tema complexo e multifacetado, cuja resolução exige não apenas uma interpretação meticulosa do texto legal, mas também uma análise contextual e fundamentada de cada situação.
A uniformização dos entendimentos nos tribunais superiores torna-se crucial para proporcionar segurança jurídica e assegurar a justiça no sistema judiciário brasileiro.
Somente por meio de uma abordagem cuidadosa e harmonizada será possível tratar adequadamente a complexidade desse tema, garantindo a confiança das partes envolvidas no sistema judicial do país.