O que difere o incidente de impedimento do incidente de suspeição?

Muitas vezes, nós advogados, nos deparamos com a seguinte frase proferida por pessoas que estão em uma situação na qual dependem do Poder Judiciário: “peguei um juiz parcial”; “caiu com um juiz que é contra isso”; “meu caso foi parar com um juiz que é amigo do advogado da outra parte”.

 

E, quando isso é dito, leva a crer que a distribuição do seu processo é definitiva, eterna, imutável. Mas, não é bem assim.

 

É claro que o fato de não simpatizar com determinado magistrado ou com as suas crenças não é fato suficiente para pleitear a redistribuição da sua medida judicial, MAS, caso esteja claro que você está sendo PREJUDICADO pela PARCIALIDADE de determinado magistrado, seu advogado deve se valer de duas figuras do Código de Processo Civil para afastar a pessoa que lhe impede de ter acesso ao provimento jurisdicional do qual necessita.

 

Destaca-se que o juiz, assim que receber a distribuição do processo, deve declarar-se suspeito ou impedido, não precisando justificar o porquê, podendo manifestar “motivo de foro íntimo”.

 

Agora, quando a questão é levantada por advogados, deve-se permanecer entre os artigos 144 a 148, do Código de Processo Civil.

 

O incidente de impedimento gera a presunção absoluta (juris et de jure) da parcialidade do magistrado, enquanto no incidente de suspeição, essa presunção é relativa (juris tantum).

 

A suspeição é proveniente de um vínculo íntimo e subjetivo do juiz(a) com alguma das partes que integram o organograma processual (partes, assistentes, peritos, (...)). Sobre essa hipótese, o Código de Processo Penal delimitou-a às linhas do artigo 254, que preveem:

 

“Art. 254.  O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:

I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;

II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;

III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;

IV - se tiver aconselhado qualquer das partes;

V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;

Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.”

 

E, por sua vez, o Código de Processo Civil:

 

“Art. 145. Há suspeição do juiz:

I - amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes ou de seus advogados;

II - que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa ou que subministrar meios para atender às despesas do litígio;

III - quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive;

IV - interessado no julgamento do processo em favor de qualquer das partes.

  • 1º Poderá o juiz declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de declarar suas razões.
  • 2º Será ilegítima a alegação de suspeição quando:

I - houver sido provocada por quem a alega;

II - a parte que a alega houver praticado ato que signifique manifesta aceitação do arguido.”

 

 

Pois bem, através da leitura dos dispositivos, é nítido que além de uma possibilidade de a parte alegar a suspeição de magistrados que se envolvem pessoalmente com a lide por motivos subjetivos, É DEVER do juiz, no exercício de sua função, afastar-se da resolução de demanda na qual possui interesse, seja ele qual for, no seu resultado.

 

Tal como não deve o médico operar sua filha, ou não se recomenda ao advogado advogar em causa própria.

 

O outro cenário de afastamento do magistrado das decisões processuais é resultado do incidente de impedimento, que afasta a atuação do juiz(a) quando:

 

  1. A) caso seu cônjuge ou parente tenha de alguma forma atuado no processo;
  2. B) quando o próprio juiz tiver exercido outra função (advogado, servidor por exemplo) no mesmo processo;
  3. C) tiver atuado como juiz no mesmo processo em instância inferior;
  4. D) quando o próprio magistrado, seu cônjuge ou parentes forem parte no processo, ou tenham interesse direto na causa.

 

As previsões legais encontram-se no artigo 252, do Código de Processo Penal e 144, do Código de Processo Civil.

 

Ou seja, tal como a parte é analisada no processo, ficando nua aos olhares da justiça, fica aquele que opta a servi-la e, principalmente, a dar seguimento e rumo à vida do cidadão brasileiro.

 

A obrigatoriedade da imparcialidade do juízo é chave mestra de toda a cadeia processual. E, por essa importância, é dever de todos nós, advogados, assegurar o seu cumprimento integral.


A Importância do Aviso de Recebimento (AR)

Ao analisar uma medida judicial, muitas vezes deixamos de analisar detalhes essenciais à sua validade, sendo um deles o Aviso de Recebimento, o conhecidíssimo “AR”. Não são poucas as vezes em que ele é a chave mestra para o deslinde de uma peleja judicial.

 

O Aviso de Recebimento tem peso e é infinitamente mais importante do que se imagina. É possível anular uma dívida – tributária, civil, trabalhista, (...) – pela falta de preenchimento dos requisitos mínimos de validade de um aviso de recebimento.

 

Recentemente (25/08), o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás suspendeu um mandado de busca e apreensão por obra da irregularidade do AR. Pela impossibilidade de se verificar, com exatidão, o destinatário e remetente da correspondência, o ato de citação foi anulado, retomando o processo ao estágio inicial.

 

E, há muito, é este o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que também reconhece a ilegitimidade da citação quando efetivada por terceiros (Recurso Cível: 71000787663).

 

Em causas judiciais cujo patrocínio é deste escritório, a anulação de processos em virtude de o Aviso de Recebimento ter sido recebido por terceiro alheio à lide  sem exposição dos dados de identificação do recebedor (RG).

 

E, neste sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é uníssona:

 

“Hipótese em que não consta do alvo do aviso de recebimento, carimbo ou o registro legível com indicação do nome e documento de identidade da pessoa que recebeu a citação, sendo ilegível sua própria assinatura, de modo a inviabilizar sua identificação. Havendo dúvida quanto à validade da citação, merece ser mantida a solução dada pelas instâncias ordinárias, impondo-se o recebimento da contestação, ainda que intempestiva, em prol da garantia do direito de defesa”[1]

 

Ou seja, não é absoluta a decretação de revelia, sem darem conta da ausência da citação válida. O momento, a forma e a realização regular da citação devem ser minuciosamente apreciadas. Caso contrário, viola-se nosso Código Civil, que estabelece a nulidade do negócio jurídico em que não se fizerem presentes os requisitos essenciais de validade do ato jurídico:

 

Art. 166. “é nulo o negócio jurídico quando for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade”

 

O Código Civil (CC) também estabelece, em seu artigo 248, que o carteiro que realizar a entrega da correspondência ao citando, exigirá, para a entrega do documento citatório, a assinatura do recebedor e o número de seu RG, requisitos de validade do ato convocatório.

 

O que ocorre, todavia, é que muitos se esquecem de verificar se foram efetivamente preenchidos todos os requisitos de validade do Aviso de Recebimento, muitas vezes sendo perdida a oportunidade de anulá-los, assim como a citação, intimação, notificação, (...).

[1] STJ, 4ª T., REsp 1.639.726.


A exclusão ou retirada de sócios deve ser feita judicial ou extrajudicialmente?

A Constituição Federal garante a todo cidadão a liberdade de associação, reconhecendo, no inciso XVII, do artigo 5º, que "é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar."

 

O artigo 421, do Código Civil (CC) trata da liberdade econômica ao afirmar que “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, observado o disposto na Declaração de Direitos de Liberdade Econômica.”

 

Por sua vez, o artigo 1029, do Código Civil brasileiro assegura que “além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.”

 

O artigo 1030, do referido diploma prevê, por sua vez, a exclusão judicial do sócio, ao afirmar que  “ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente”

 

Por fim o artigo 1085, do CC prevê as hipóteses em que a exclusão do sócio poderá ocorrer extrajudicialmente, sem necessidade de judicialização:

“Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.”

 

Do que se nota dos artigos supracitados, é a liberdade que o sócio tem de não ser submetido a aceitar participar de uma sociedade empresarial e dela não poder retirar-se.

 

Há a liberdade de não ser obrigado a permanecer sócio de uma pessoa que atua na contramão da lei e do contrato social, cometendo faltas graves no cumprimento de suas obrigações sociais, colocando em risco a continuidade das atividades empresárias.

 

A possibilidade de que haja a exclusão do sócio extrajudicialmente deverá decorrer, inclusive, de expressa disposição no contrato social da sociedade limitada. Caso não haja essa previsão, a exclusão deve ser realizada judicialmente.

 

E neste caso de a exclusão ter de ser judicializada, a intervenção judicial não poderá, embora muitos equivocadamente o façam, se aprofundar em questões que levam à subjugação da empresa à discricionariedade e às escolhas subjetivas do terceiro imparcial, representado pela figura do julgador.

 

 

 


Auxiliares da Justiça: pressupostos subjetivos e objetivos de suas funções

Há determinados atores processuais que, embora devessem exercer papéis coadjuvantes na trama processual, acabam exercendo papel principal no desenlace do conflito de interesses levado, por meio de procedimentos judicial, à apreciação do poder judiciário.

Muitas vezes a jurisdição lhes é por completo terceirizada, passando estes chamados “auxiliares da justiça” a ditar, como protagonistas, o destino da causa judicial.

E esta espécie de terceirização do poder judicante é alimentada, muitas vezes, pelos advogados dos litigantes que pelejam sob o crivo da justiça, os quais, em inadmissível indolência, acabam chancelando esta troca de papéis entre juiz e aquele que seria unicamente seu “auxiliar”, o fazendo pela omissão de diligenciar e de fiscalizar a causa com maestria, cautela e cuidados, a respeito destes ajudantes do juízo.

Peritos judiciais, por exemplo, são nomeados na maioria das vezes sem aprofundados questionamentos a respeito de sua capacidade profissional, unicamente por constarem no rol daqueles cadastrados em listas de profissionais disponibilizadas nos foros judiciários e por serem detentores de diploma escolar, o que não deveria, num país cuja formação profissional é sabidamente pobre e deficitária, ser o bastante para alçar estes meros coadjuvantes ao posto de autoridade judiciária.

Estes requisitos objetivos, uma vez preenchidos, habilitam os peritos a assumirem suas funções no processo judicial.

No entanto, há os subjetivos, o quais se referem à imparcialidade, à isenção de ânimos, à independência e à falta de impedimento para o exercício da função, os quais, muitas vezes, são relegados à questão de somenos importância, o que é uma temeridade para o futuro da ação, merecendo, pois, atenta análise e fiscalização por todos os atores processuais.

A maioria dos peritos judiciais faz jus à nomeação e à dignidade do múnus assumido. No entanto, há, como em todas as profissões, aqueles que fazem mal uso das prerrogativas conferidas pelo judiciário para prestarem, como auxiliares, a mais eficiente jurisdição.

Tais “peritos” – os que não incorporam os requisitos para atuação leal e honesta da função - fazem, muitas vezes, e muito pela desídia dos advogados, repita-se, da jurisdição uma extensão de suas atividades privadas, e ao atuarem nas lides, com este profano objetivo de lucro, transformam o judiciário num balcão de negócios.

Sorte que referidos ‘profissionais’ são pequena minoria dentre aqueles que prestam, como auxiliares, a jurisdição em favor da sociedade.

Outro auxiliar da justiça que exige atenta fiscalização, pois também responsável, muitas das vezes - principalmente em pequenas e médias comarcas, nas quais exerce o monopólio - pela transformação do judiciário num amplo e libertino campo de negócios, é o leiloeiro, sobre quem se falará em breve neste mesmo espaço, sem antes deixar consignado que felizmente há, também em sua maioria, profissionais que fazem jus à confiança lhes depositada pela comunidade jurídica.


Juros de mora cobrados pela Receita Federal provenientes de sua própria demora no julgamento dos processos administrativos fiscais

Entendemos inexigíveis os juros de mora que, sem qualquer questionamento ou censura, são aplicados à créditos fiscais da Fazenda Nacional, constituídos mediante processo administrativo fiscal em que o excesso de prazo na prática dos atos procedimentais ultime-se na ultrapassagem de 360 (trezentos e sessenta) dias para sua conclusão.

Ultrapassados os 360 (trezentos e sessenta dias) para a finalização do processo administrativo fiscal, o qual inicia-se com o auto de infração e sua notificação ao contribuinte “infrator”, incabível, a partir daí, a cobrança de juros de mora.

Caso contrário, o Estado-Arrecadador, ao beneficiar-se da sua própria torpeza, terá um incentivo a mais para postergar a conclusão do processo: acumular mais recursos decorrentes da soma de juros de mora, os quais, compostos ao valor do crédito fiscal, e na causação de prejuízo do contribuinte, elevarão sobremaneira o débito que futuramente constituirá a certidão de dívida ativa.

Nosso entendimento vai além: ao cabo de cada mês do processo administrativo fiscal, deverá o contribuinte verificar quais os prazos previstos na legislação para a prática dos atos cuja cadeia de desenvolvimento é imperativa e obrigatória foram descumpridos pelo Estado, e ir somando-os até a conclusão do prazo de 360 dias, termo final, também segundo a lei, para o término do processo fiscal.

Por exemplo: em determinado mês do trâmite do processo administrativo fiscal, o Estado-processante deixou de cumprir à risca prazos que lhe foram concedidos por lei para a prática de determinado ato procedimental. No mês, houve, por exemplo, o excesso de prazo no cumprimento do ato em 10 (dez) dias. No mês seguinte, deixou-se de cumprir os prazos – p. exemplo: de proferir decisões a respeito de pedido formulado pelo contribuinte – em 8 (oito) dias, e assim continuadamente a soma dos prazos perdidos pela Fazenda.

No final dos 360 (trezentos e sessenta) dias, e mesmo no caso em que neste prazo encerre-se o processo administrativo fiscal – o que sabemos é uma fantasia – chegaremos à conta de 70 (setenta) dias em que os atos procedimentais foram cumpridos fora do prazo.

Entendemos que por 70 (setenta) dias não poderão ser cobrados juros de mora, e uma vez exigidos pela Fazenda, hão de ser desconsiderados da conta ‘final’.

Os prazos estão previstos em lei para serem cumpridos.

Caso não o sejam, o infrator do procedimento há de ser punido. Se são os particulares, deverá sê-lo o Estado.