Corrupção entre sócios? Quais os riscos? Como proceder?

A presença de um sócio corrupto numa sociedade empresarial é um turbilhão que agita as águas da governança corporativa e da ética empresarial, exigindo uma resposta jurídica e estratégica bem articulada. A posição do sócio corrupto, seja como controlador, influente ou minoritário, desempenha um papel crucial na determinação da extensão do dano e na estratégia de resposta da empresa.

 

A influência deste sócio pode alterar significativamente a dinâmica interna e as operações da empresa, impondo riscos não apenas financeiros, mas também reputacionais.

 

Sob a égide da legislação brasileira, especificamente a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992) e a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), a empresa enfrenta responsabilidades legais diretas pelos seus atos, preconizando, a responsabilidade objetiva da sociedade, sujeitando-a a penalidades que incluem multas pesadas e restrições operacionais.

 

Essas normativas são pedras angulares na luta contra a corrupção institucional, levantando a importância da integridade nas operações comerciais e na administração pública.

 

Além das implicações corporativas, o Código Penal Brasileiro oferece uma perspectiva punitiva para os sócios envolvidos em práticas corruptas com/contra a União Federal. Delitos como tráfico de influência, descaminho e corrupção ativa - crimes praticados em benefício próprio mas em desfavor do Estado, tendo o agente público como mecanismo para o ato - delineados nos artigos 331, 332 e 333, podem levar a sanções severas, incluindo penas de prisão e multas, sublinhando a seriedade com que o sistema jurídico brasileiro aborda a corrupção no ambiente jurídico funcional. Confira-se:

 

“Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.” Tráfico de Influência

 

Art. 332 - Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995) Parágrafo único - A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário. (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995).” Corrupção ativa

 

Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003) Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.” Descaminho

 

Destarte, quando a permanência do sócio corrupto se torna insustentável, a empresa pode recorrer a diversas estratégias para resolver o conflito. Entre elas encontra-se a figura do distrato consensual, a saída motivada ou a exclusão do sócio, seguindo os procedimentos estabelecidos no Código Civil, notadamente nos artigos 1.004, 1.030 e 1.085. Veja-se:

 

“Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031.

 

Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

 

Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019)”

 

Estas ações precisam ser conduzidas com prudência, garantindo que os direitos dos sócios permanecentes sejam respeitados, afinal, se afere por óbvio que um sócio ardiloso, capaz de sobrepor seus interesses aos da entidade jurídica de direito privado, continuará implementando seus atos clandestinos durante o devido processo jurídico.

 

Sincronicamente, a responsabilização do sócio pelos danos causados é um aspecto que não pode ser esquecido. A empresa pode buscar indenizações por meio de ações de responsabilidade civil para recuperar perdas financeiras e reparar danos à sua imagem e credibilidade, não apenas buscando justiça, mas também implementando um dissuasor para futuras práticas corruptas.

 

Ligado a isto, a proteção dos interesses dos investidores e a transparência nas operações são fundamentais, especialmente em contextos onde informações sobre práticas corruptas são ocultadas. As normas da Comissão de Valores Mobiliários, especialmente a Instrução nº 358[1], enfatizam a necessidade de divulgação honesta e completa de informações aos investidores e ao mercado.

 

Por fim, vale ainda destacar, a readequação sofrida pela teoria Ultra Vires Societatis[2], embora histórica, encontra limitações no contexto atual, especialmente após alterações legislativas significativas. As mudanças refletem a evolução do direito brasileiro no que tange à responsabilidade empresarial e à proteção de terceiros - o contexto atual prioriza a rápida reparação aos terceiros antes da discussão sobre a imputação da responsabilidade pelo ato - indicando um afastamento desta teoria em favor de uma abordagem mais pragmática e responsável.

 

Neste cenário, a empresa deve estar preparada para um confronto legal e estratégico com o sócio corrupto. Além de ações judiciais para sua exclusão e recuperação de ativos, a empresa deve adotar medidas preventivas como sistemas robustos de compliance, auditorias regulares e uma política de transparência. Estas medidas são essenciais para a detecção precoce de práticas corruptas e a implementação de correções eficazes.

 

Finalmente, mas não menos importante, é preciso cultivar uma cultura corporativa que valorize a ética e a integridade. Programas de educação e treinamento para funcionários e gestores são fundamentais para reforçar os bons costumes dentro da instituição e demonstrar as consequências dos atos ilícitos se forem praticados.

 

Lembrem-se, in perpetuum, que a corrupção age como um verme, de forma insidiosa, suga a vitalidade da empresa sem se revelar, operando na clandestinidade e tornando-se aparente apenas quando o estrago já está consumado. Frequentemente, é o elemento que impede o progresso da instituição, iniciando um processo de regressão silenciosa e destrutiva.

 

[1]Instrução nº 358 - Dispõe sobre a divulgação e uso de informações sobre ato ou fato relevante relativo às companhias abertas, disciplina a divulgação de informações na negociação de valores mobiliários e na aquisição de lote significativo de ações de emissão de companhia aberta, estabelece vedações e condições para a negociação de ações

[2]A teoria Ultra Vires Societatis dispõe que se o administrador, ao praticar atos de gestão, violar o objeto social delimitado no ato constitutivo, esse ato não poderá ser imputado à sociedade. O objeto social, por sua vez, delimita o ramo de atividade da sociedade.


Supremo Tribunal Federal decide o papel dos veículos de informação na publicação de entrevistas

Na iminência de um veredito que reverberará nos anais da jurisprudência brasileira, com o tema sendo retomado e a decisão marcada sessão plenária datada para amanhã (29/11), o Supremo Tribunal Federal (STF) se debruça sobre a delicada balança que equilibra a liberdade de informação e expressão com a responsabilidade dos veículos de comunicação. 

 

Este pleito, desencadeado pelo caso que resultou na condenação do Diário de Pernambuco, em que admitiram a possibilidade de responsabilizar civilmente jornais por injúria, difamação ou calúnia proferida por entrevistados, questiona até que ponto um veículo deve ser considerado corresponsável ao publicar declarações de terceiros, mesmo sem endossá-las.

 

Anteriormente, o processo, instigado pelo ex-Deputado Federal Ricardo Zarattini Filho, figura que enfrentou a ditadura militar, levantou questionamentos cruciais sobre a natureza da responsabilidade dos veículos de comunicação diante de declarações injuriosas. Zarattini, acusado em uma entrevista concedida ao Diário de Pernambuco, de envolvimento em um atentado a bomba durante a ditadura militar, buscou reparação por danos morais.

 

No epicentro do debate, a Suprema Corte enfrenta a árdua tarefa de definir os limites da liberdade de expressão e informação, salvaguardando o direito à honra e à vida privada.

 

Durante a análise do tema na primeira plenária de julgamento, entre as propostas minuciosamente examinadas, duas se destacam como inadequadas para a robustez do direito e do jornalismo:

 

  • Empresa jornalística não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa. (Marco Aurélio);
  • A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, não permitindo qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais. (Alexandre de Moraes).

 

A primeira proposta, desconsiderando qualquer responsabilidade do veículo, parece ignorar a incompatibilidade entre o bom jornalismo e a divulgação deliberada de imputações falsas. O repúdio a atitudes que desconsiderem a veracidade dos fatos precisa de uma postura menos leniente.

 

A segunda, por outro lado, impõe responsabilidade indiscriminada ao veículo sempre que declarações se revelarem caluniosas, mesmo se adotados cuidados na apuração. Tal postura, por sua vez, ignoraria a dinâmica arriscada e, por vezes, volátil, da atividade jornalística.

 

No rastro das ponderações, duas teses propostas se alinham com a prudência, assemelhando-se aos princípios consagrados pelos Estados Unidos no caso New York Times Co. v. Sullivan (1964). Naquele momento, a Suprema Corte Americana exigiu prova do conhecimento prévio da falsidade da notícia ou negligência na busca pela verdade, doutrina esta conhecida como actual malice:

 

  • Somente é devida indenização por dano moral pela empresa jornalística quando, sem aplicar protocolos de busca pela verdade objetiva e sem propiciar oportunidade ao direito de resposta, reproduz unilateralmente acusação contra ex-dissidente político, imputando-lhe crime praticado durante regime de exceção. (Edson Fachin);
  • Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios. (Luís Roberto Barroso).

 

O STF, ao abraçar uma destas perspectivas, poderá prestigiar a atividade jornalística, protegendo-a contra as punições decorrentes de erros involuntários.

 

A punição, nesse contexto, não deve derivar de meros equívocos, mas sim de atos intencionais, impregnados da intenção deliberada de causar prejuízo. Penalizar erros éticos, frutos da apuração diligente, instalaria um manto de silêncio sobre a imprensa, minando seu papel essencial na divulgação de informações cruciais para a sociedade.

 

Afinal, o trabalho jornalístico sofre com a permanente ameaça de processos resultantes de um dos formatos e instrumentos mais importantes para sua existência: as entrevistas. 

 

Imputar uma responsabilidade que não cabe aos veículos pode forçá-los, exempli gratia, a imposição de filtros prévios nas respostas dos entrevistados, ou mesmo à renúncia a entrevistar muitas pessoas, especialmente ao vivo. 

 

Tudo isso motivado pelo temor de potenciais processos judiciais.

 

O prudente equilíbrio almejado pelo STF reside em uma tese que reconheça as características intrínsecas do jornalismo, preservando sua essência no regime democrático. A busca incessante da verdade, mesmo diante de erros pontuais, é a essência da atividade jornalística. A única justificativa para punição reside na má-fé e na negligência grosseira em relação aos fatos.

 

É preciso que o jornalismo seja, sim, exercido com ética e respeito aos princípios fundamentais da profissão, como a verificação dos fatos e a abertura ao contraditório, veículos de imprensa e jornalistas devem buscar contextualizar declarações, ouvir eventuais acusados e corrigir informações, (...).

 

Assim como é preciso que a tese eleita seja não apenas equilibrada, mas, também, sábia o suficiente para preservar os alicerces democráticos, permitindo que a imprensa, com suas virtudes e imperfeições, continue a desempenhar seu papel vital na sociedade brasileira. 

 

Utilizando-me de renomadas figuras históricas, concluo com os seguintes dizeres:

 

Uma imprensa livre pode, é claro, ser boa ou ruim, mas, certamente sem liberdade, a imprensa sempre será ruim [Albert Camus]

 

Afinal

Sem liberdade de criticar, não existe elogio sincero [Pierre-Augustin de Beaumarchais]


Agência de marketing digital é condenada a ressarcir empresários por cláusula abusiva

Em uma decisão marcada pela inovação, a 4ª Juizado Especial Cível de Porto Alegre (Rio Grande do Sul) proferiu sentença condenatória contra uma agência de marketing digital, determinando o ressarcimento de expressivos R$18,8 mil a uma dupla de empresários.

 

A juíza Morgana Lunardelli fundamentou sua decisão na meticulosa análise de um contrato de franquia, destacando a cláusula que impunha a perda total da quantia cobrada no contrato preliminar.

 

Os empresários Giuseppe Bandeira Barreto e Marcos Serralvo Capozzi alegaram terem sido induzidos a erro durante as negociações que culminaram na assinatura do contrato de franquia. Conforme alegaram, os acordos preliminares de treinamento assinados em julho de 2021, com base na Circular de Oferta da Franquia (COF) fornecida pela agência, não refletiram adequadamente as nuances do negócio.

 

A controvérsia surgiu quando, ao término do treinamento, os empresários perceberam que a reprovação resultaria na não efetivação do contrato, com a retenção integral dos valores investidos. Em busca de equidade contratual, a dupla pleiteou a nulidade do contrato e a condenação da agência ao pagamento de perdas e danos.

 

A empresa, por sua vez, argumentou a validade da relação contratual, sustentando que os empresários tinham pleno conhecimento das informações fornecidas na COF.

 

A magistrada, embora tenha afastado a nulidade do contrato, ressaltou que a cláusula em questão violava os princípios fundamentais do equilíbrio contratual e da proporcionalidade:

 

"Tratando-se de contrato preliminar de franquia empresarial, vigora, da mesma forma, os princípios do equilíbrio contratual e da proporcionalidade"

 

A juíza determinou a redução da cláusula penal de 100% para 50%, estabelecendo o valor a ser restituído em R$18.833,33 (dezoito mil oitocentos e trinta e três reais e trinta e três centavos) com correção pelo IGP-M e juros simples.

 

O contrato de franquia, notável modalidade de transferência de tecnologia, tem se destacado como um modelo eficaz de comercialização global de produtos e serviços. Esse arranjo, baseado na cooperação entre empresas, proporciona a produção e comercialização direta de produtos associados a marcas consolidadas.

 

Sob a ótica jurídica, a franquia se revela como um conjunto de contratos, destacando-se um como principal e os demais como acessórios ou dependentes.

 

Amplamente utilizado no setor comercial, o contrato de franquia busca proporcionar ao consumidor um acesso mais direto e eficiente aos produtos ou serviços oferecidos.

 

Esse enquadramento destaca o contrato de franquia como um instrumento de transferência de tecnologia, com o franqueador cedendo não apenas o direito de uso de marca ou patente, mas também a tecnologia de implantação e administração do sistema operacional.

 

Dessa forma, além do Direito Contratual, a franquia se insere no âmbito do Direito da Propriedade Industrial ou, de forma mais abrangente, do Direito da Propriedade Intelectual.

 

O equilíbrio essencial entre franqueador e franqueado é fundamentado em direitos e obrigações claramente definidos. O franqueador, detentor da tecnologia, recebe remuneração através de royalties e taxas iniciais acordadas. Além disso, tem o direito de supervisionar o cumprimento dos objetivos contratuais pelo franqueado, escolher novos franqueados e garantir a qualidade na expansão da marca.

 

Suas obrigações incluem:

 

  • Fornecer treinamento completo, disponibilizar tecnologia e realizar atividades de promoção, pesquisa de mercado e assistência ao franqueado.

 

Por sua vez, o franqueado, beneficiário dos direitos concedidos, tem o direito de utilizar a tecnologia do franqueador, comercializar produtos da franqueadora e desfrutar de exclusividade em sua área. Além disso, tem garantido o suprimento regular de insumos.

 

Suas obrigações abrangem:

 

  • O pagamento de remunerações previstas, aquisição exclusiva de insumos do franqueador, e a manutenção dos padrões de qualidade e operação estabelecidos.

 

A gestão eficaz desse equilíbrio é vital, sendo a decisão proferida pela magistrada um reflexo desse entendimento. A juíza entendeu não haver condições de nulidade, mas sim de desequilíbrio contratual. Em uma relação "mutualística," não pode uma das partes receber uma maior onerosidade que afete e interfira nos dois lados da balança, esse tipo de relação quebraria o equilíbrio visado pelo contrato de franquia, criando uma relação de “comensalismo” entre o Franqueador e o Franqueado

 

Por fim, conclui-se que a decisão judicial referida ressalta a importância da equidade e proporcionalidade nos contratos de franquia, evidenciando a necessidade de proteger os interesses dos franqueados diante de cláusulas que possam resultar em prejuízos desmedidos.

 

A sentença reforçou a responsabilidade das partes envolvidas em manter relações contratuais justas e equitativas, contribuindo para um ambiente empresarial mais transparente e ético.

 

O mundo empresarial, apesar de muitas vezes ser caracterizado como um ambiente implacável, onde "os fracos não têm vez", é, na verdade, uma arena regida por leis, princípios e fundamentos. A transgressão destes não resulta em nada além do direito ao ressarcimento, conforme inequivocamente proclamado pela digníssima magistrada.

 

A legalidade e a ética não se configuram como simples formalidades, mas constituem pilares fundamentais tanto no âmbito empresarial quanto no jurídico.


No Dia da Consciência Negra, veja os movimentos do STF e das Assembleias Legislativas Estaduais para impulsionar os avanços jurídicos necessários.

No pulsar da sociedade brasileira, o Dia da Consciência Negra (20/11) transcende a mera celebração cultural, transformando-se em uma profunda reflexão jurídica sobre igualdade e justiça. Num cenário onde a lamentável persistência da discriminação racial se faz notar, as recentes decisões judiciais e legislações estaduais delineiam uma mudança, uma nova aurora na busca por um país mais justo e equitativo.

 

O Supremo Tribunal Federal (STF), ao reconhecer a constitucionalidade dos feriados municipais, como o Dia da Consciência Negra em São Paulo - ADPF 634, Data de Publicação: 09/12/2022 - ergueu uma voz não apenas legal, mas moral.

 

A Ministra Cármen Lúcia, em seu voto, destacou que esse dia possui:

 

"inegável viés de fomento cultural, como atividade cultural afirmativa, contra ações racistas do passado."

 

Ao citar a competência privativa da União para legislar sobre Direito do Trabalho, o Excelso Tribunal reconheceu que o Dia da Consciência Negra vai além dessa esfera, sendo um instrumento para combater o racismo e reduzir as desigualdades.

 

O atual Presidente da Suprema Corte, Ministro Luís Roberto Barroso, ressaltou que esse feriado é uma:

 

"Afirmação da igualdade, um princípio tão reforçado pela Constituição Federal."

 

A decisão do STF ecoou nas ações dos estados, abrindo precedentes para diversas leis estaduais que instituem esse dia como feriado - exempli gratia, Lei 17.746/2023, instituída pelo governador Tarcísio de Freitas - o Dia da Consciência Negra como feriado estadual.

 

Vide também a decisão da ADI 4.092, julgada em agosto deste ano, onde foi validada a lei que criou o "Dia de São Jorge” - Lei estadual 5.198/2008.

 

Paralelamente, mas não menos importante, tais decisões corroboram para compreensão de que os entes federados têm competência para legislar sobre feriados de alta significação étnica?[...] Talvez, uma conversa para outra hora.

 

Afinal, estamos em um momento significativo para o Estado de São Paulo e para o Brasil, este 20 de novembro de 2023, marcou a primeira celebração do Dia da Consciência Negra após sua oficialização como feriado estadual.

 

Entretanto, neste cenário, surge uma outra indagação que, diferentemente da anterior - supracitada - não poderá ser adiada:

 

  • Qual é a responsabilidade do meio jurídico na luta antirracista?

 

Lógico, acabamos de relatar as movimentações que a Suprema Corte teve sobre o tema, mas como anda o lado interno dos maiores tribunais do Brasil, quando se trata de igualdade racial?

 

Ao analisar o Supremo Tribunal Federal (STF), observamos que, dos 170 Ministros que passaram pela Suprema Corte desde o início de suas atividades, apenas três eram negros. Pedro Lessa e Hermenegildo Barros contribuíram para a Corte na primeira metade do século XX, enquanto Joaquim Barbosa atuou mais recentemente, de 2003 a 2014.

 

Já na principal Corte Superior do Brasil, nos é revelado uma alarmante disparidade. Desde a criação da Corte da Cidadania em 1989, 75 ministros passaram por ela, sendo que apenas o Ministro Benedito Gonçalves se declara negro entre os atuais 33 ministros.

 

Ao analisar o panorama de forma geral, constata-se que do total de 711 ministros que passaram pelas Cortes Superiores, apenas 11 eram negros ou pardos, evidenciando uma representatividade negra de apenas 1,5%. Quando consideramos os cargos atuais, dos 78 ministros, apenas 3 são negros ou pardos, totalizando 3,84% da composição das Cortes.

 

Essa falta de representatividade não é exclusiva das Cortes Superiores. Conforme um relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2023, em uma amostra de 11.123 magistrados de 1ª e 2ª instâncias, apenas 1.704 (12,8%) declararam-se pardos, e 226 (1,7%) negros. A pesquisa ressalta que mais de 80% dos magistrados declaram-se brancos.

 

Em resposta ao problema histórico, a Resolução CNJ 203/15, em vigor até 2024, determina a reserva de 20% das vagas em concursos públicos para negros, buscando uma transformação necessária na composição e representatividade do Poder Judiciário brasileiro.

 

A jornada jurídica pelo Dia da Consciência Negra não é apenas uma caminhada legal, mas uma narrativa que entrelaça passado, presente e futuro.

 

Em um país marcado pela diversidade, as decisões judiciais e legislações recentes são faróis de esperança, indicando que, juntos, podemos construir uma nação onde a igualdade e a justiça são mais do que princípios - são realidades vivas.

 

Nas palavras do falecido ativista dos direitos humanos e raciais, Malcolm X:

 

“A luta não é por integração ou por separação, a luta é para sermos reconhecidos como seres humanos.”

 

Profundas palavras, que na pintura fresca estendida sobre esse texto, poderiam ser enriquecidas pela citação do jurista, filósofo e professor universitário Silvio Luiz de Almeida:

 

“O racismo se expressa concretamente como desigualdade política, econômica e jurídica”

 

 

Ao comemorarmos o Dia da Consciência Negra, não apenas celebramos a riqueza da cultura africana, mas também reafirmamos um compromisso coletivo com uma sociedade na qual a cor da pele não determina o destino. Nessa junção entre o jurídico e o emocional, não encontramos apenas a frieza da lei, mas vislumbramos a justiça, orientando-nos em direção a um futuro em que todos são tratados com igualdade perante ela.

 

Esse futuro, almejado por muitos, será, com certeza, vivido pelas gerações que estão por vir.


Sustentação Oral: direito ou não do advogado? Entenda o posicionamento do STF e do Conselho Federal da OAB acerca deste tão importante tema.

Na mais recente sessão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), sob a presidência do Ministro Alexandre de Moraes, foi negado a um advogado o direito de realizar sustentação oral na tribuna do colegiado.

 

No contexto jurídico brasileiro, em consonância com o princípio da ampla defesa e o artigo 937, do Código de Processo Civil (CPC), não existem restrições quanto à realização de sustentação oral perante a Suprema Corte.

 

Qualquer advogado cujo recurso alcance esse patamar, tem o direito assegurado de apresentar oralmente seus argumentos durante as sessões. Apesar de os regimentos internos dos tribunais tutelarem detalhes do procedimento de arguição, não há proibição legal para que qualquer advogado exponha seus pontos de vista nos tribunais.

 

A medida, tomada com base na argumentação de que o regimento interno do STF prevalece sobre normas gerais – o que, diga-se de passagem, é uma ofensa à Lex Superior compará-la a “norma geral” - provocou imediata reação por parte do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) e da Seccional da OAB na Paraíba.

 

O Presidente da OAB-PB, Harrison Targino, expressou que o respeito ao STF não deve implicar na aceitação de medidas que restrinjam a capacidade de defesa, independentemente da natureza dos fatos sob julgamento.

 

Durante a sessão, o advogado, embasando-se no Estatuto da OAB e na Lei Federal nº 8.906, solicitou a realização de sustentação oral, alegando que no Plenário Virtual era concedida essa prerrogativa. Todavia, Moraes refutou, sustentando que decisões anteriores do colegiado já haviam excluído tal possibilidade.

 

A OAB manifestou preocupação com o que considera uma flexibilização ou supressão do direito constitucional ao contraditório e à ampla defesa pelo STF.

 

 

A manifestação da entidade, assinada por seu Presidente, Beto Simonetti, ressalta a defesa intransigente do Judiciário e do sistema eleitoral, mas alerta que as prerrogativas da advocacia não podem ser coibidas.

 

Essa não é a primeira vez que a OAB se posiciona diante de possíveis limitações aos direitos dos advogados. Em uma audiência realizada anteriormente com o Ministro Alexandre de Moraes, a OAB já havia solicitado o respeito ao direito de sustentação oral em julgamentos na Corte, enfatizando que a negativa de sustentações orais, configura violação tanto às Leis quanto à Constituição Federal.

 

Assim, a Ordem dos Advogados do Brasil mantém sua postura firme na defesa das prerrogativas da advocacia, em prol da eficácia do sistema judicial e democrático.


Legalização do aborto na França e pedidos da ONU: impactos no possível julgamento do STF

A recente decisão do Presidente francês, Emmanuel Macron, de incorporar o direito ao aborto na Constituição da França, promovendo sua "irreversibilidade", estabeleceu um marco no cenário internacional.

 

Esta iniciativa surge em um contexto global no qual as conquistas dos direitos reprodutivos das mulheres estão sendo objeto de reexame, como evidenciado pela revogação da histórica decisão Roe v. Wade nos Estados Unidos, ocorrida há um ano.

 

No Brasil, o Supremo Tribunal Federal se encontra diante de uma decisão pendente sobre a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. Esta controvérsia é agravada pelas recentes recomendações do Comitê da ONU para Direitos Econômicos e Sociais, instando o país a descriminalizar o aborto e a rejeitar o polêmico marco temporal na demarcação de terras indígenas.

 

O comitê recomendou que o Brasil revise a legislação que proíbe o aborto, visando torná-la "compatível com a integridade e a saúde das mulheres". Também foi sugerido que o país assegure o acesso ao procedimento de forma segura na rede pública de saúde.

 

A legislação brasileira mencionada pela ONU remonta a 1940, e estipula que o aborto induzido pela gestante é considerado crime, com penas de 1 a 3 anos de detenção. Quando realizado por terceiros, a punição pode chegar a 10 anos de reclusão.

 

Além disso, há a legalidade do aborto em casos específicos, tais como: estupro; risco à vida da gestante e anencefalia fetal. Contudo, as perspectivas públicas sobre o aborto são vastamente divergentes, evidenciando a complexidade dessa questão.

 

A decisão de Macron e as diretrizes da ONU apresentam-se como fatores influentes, introduzindo uma dimensão internacional ao debate nacional. A proximidade política entre Macron e o Presidente Lula adiciona uma camada de complexidade a essa dinâmica, potencialmente afetando as deliberações no Supremo Tribunal Federal.

 

Atualmente, o STF, ao confrontar a possível descriminalização, enfrenta o desafio de conciliar as demandas dos direitos das mulheres com a diversidade de opiniões na sociedade e no Congresso Nacional.

 

O voto da ex-Ministra Rosa Weber, no momento em que era Relatora do caso, foi a favor da descriminalização do aborto até as 12 primeiras semanas de gestação, durante a sessão virtual da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442.

 

Em sua extensa fundamentação, a Ministra argumentou que os artigos 124 e 126 do Código Penal, que penalizam a prática do aborto, não estão em conformidade com a Constituição Federal, sendo a mesma argumentação utilizada pela ONU.

 

A então Ministra enfatizou a desproporcionalidade das penas atribuídas à gestante e às pessoas envolvidas no procedimento, e salientou a importância de respeitar os direitos reprodutivos das mulheres, considerando o aborto como uma questão de direitos humanos e saúde pública.

 

Weber também abordou a complexidade do debate sobre o início da vida, destacando que não há consenso científico, filosófico ou religioso sobre esse ponto. Ela argumentou que o direito à vida desde a concepção não pode ser usado como fundamento para proibir totalmente a interrupção da gestação.

 

Por fim, ressaltou que a criminalização do aborto não atingiu seus objetivos, e que é necessário garantir a autonomia das mulheres na tomada de decisões sobre sua saúde reprodutiva.

 

Fato é que a criminalização progressiva das mulheres vem cedendo, no contexto nacional e internacional, lugar a uma compreensão mais ampla e humanitária da questão.

 

O arcabouço legal em vigor, delineado por decisões como a concessão de liminares para interrupção de gestações inviáveis e a análise da constitucionalidade de leis restritivas, destacam a progressiva compreensão da necessidade de respeitar os direitos fundamentais das mulheres.

 

No entanto, a despeito dessas exceções, a realidade enfrentada pelas mulheres brasileiras é marcada por obstáculos burocráticos e negligência por parte das autoridades de saúde, resultando em altas taxas de mortalidade materna.

 

É necessário olhar para além das leis e regulamentações, compreendendo a complexidade da experiência das mulheres e garantindo políticas públicas que resguardem seus direitos em um contexto de justiça social reprodutiva.

 

À medida que o STF continua a deliberar sobre a descriminalização do aborto nas primeiras doze semanas de gestação, é crucial reconhecer que esta não é apenas uma luta por um direito legal, mas sim uma batalha pela vida das mulheres.


Honorários Advocatícios no Brasil: entre a equidade e as novas teses do STJ

Há sete meses, em uma decisão emblemática proferida durante a sessão da 2ª Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 21 de março de 2023, o ilustre Ministro Herman Benjamin expressou preocupações profundas acerca da equidade na aplicação dos honorários advocatícios.

Ao julgar o Recurso Especial que envolvia a Fazenda Pública do Estado de São Paulo (FESP) e a Telefônica Brasil, o Ministro confrontou-se com a questão dos honorários advocatícios, desdobrada a partir de uma multa draconiana de R$ 23,5 milhões imposta à empresa, por erro na base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

A sentença inaugural aplicou a regra geral estipulada no artigo 85, do Código de Processo Civil, impondo honorários no montante de 10% sobre o valor da causa, totalizando cifras colossais de R$ 2,3 milhões.

Entretanto, em 2017, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, zeloso pela prudência e justiça, reputou esse valor excessivo e, valendo-se do método da equidade, estabeleceu os honorários em R$ 250 mil.

Ao acolher a tese proferida pela Corte Especial do Superior Tribunal Justiça e majorar os honorários devidos pela FESP, o Ministro Herman Benjamin expressou sua inquietação. Assim, fez questão de ressaltar que, ao seguir a maioria dos votos da Corte Especial, estava sendo compelido a chancelar honorários que destoavam de um autêntico senso de justiça.

Ainda que tenha destacado seu desacordo em circunstâncias excepcionais, o ministro reconheceu a imperatividade de seguir o precedente estabelecido pela Corte Especial.

Esse episódio ilustrou de forma vívida a tapeçaria que envolve a determinação de honorários advocatícios em causas de alta relevância financeira. As ponderações do Ministro Benjamin, ao que parece, lançaram luz sobre esse tema complexo, incitando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) a desenvolver novas teses, mais equitativas, relativas à aplicação e aferição desses honorários.

Recentemente, três teses inovadoras foram consolidadas, na tentativa de instituir um procedimento mais singular, protegendo as partes de possíveis agruras.

Uma dessas mudanças foi implementada durante o julgamento do Recurso Especial nº 1.824.564/RS pela 3ª Turma do STJ. A base de cálculo dos honorários foi redefinida para evitar que um credor se “metamorfoseasse” - momentaneamente evocando a imaginação de Franz Kafka - em devedor.

O contexto envolveu a inclusão de apenas dois apartamentos na partilha litigiosa, avaliados em cerca de R$ 3,1 milhões, enquanto a condenação em honorários atingiu desproporcionalmente R$ 2,5 milhões, superando significativamente o valor dos bens em disputa. Sob a orientação sagaz do Ministro Humberto Martins, secundado pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, firmou-se que a base de cálculo não deve ser o valor atribuído à causa, mas sim o montante que pode ser efetivamente executado pela parte vencedora. Tal medida previne distorções, assegurando que a condenação não ultrapasse o real proveito econômico da parte.

Em um outro momento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça reexaminou sua compreensão acerca da condenação em honorários advocatícios no incidente de desconsideração da personalidade jurídica, conforme consagrado no julgamento do Recurso Especial nº 1.925.959/SP, relatado pelo Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Deliberou-se que, caso o pedido de desconsideração seja indeferido, impõe-se a fixação de honorários de sucumbência em favor do advogado da parte instada a participar do contraditório.

Ressalta-se que, tal como discutido no âmbito das penalidades decorrentes do completo indeferimento do Agravo Interno (seja inadmissível ou improcedente), a aplicação da multa - neste caso, a alteração ou inversão dos honorários sucumbenciais - não deve ocorrer de forma automática. A natureza do pedido, bem como a justificativa para a não instauração do incidente, deveriam ter sido pontos de reflexão na formulação da tese. Esta lacuna deixa margem para possíveis inconstitucionalidades e danos potenciais àqueles que utilizam o incidente como um recurso legítimo para salvaguardar a justiça.

Simultaneamente a essas inovações, a Corte Especial do STJ, por intermédio do julgamento dos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 1.847.842/PR, também liderada pelo Ministro Herman Benjamin, sedimentou que a majoração dos honorários recursais não é aplicável em recursos interpostos pela parte vencedora para ampliar a condenação, mesmo que o recurso seja desprovido. Esta determinação confere segurança jurídica às partes vitoriosas, garantindo que não serão penalizadas ao buscarem um aumento da verba honorária para seus patronos - certamente a decisão que mais agradou os advogados - pois protege seus interesses e os incentiva a buscar uma justa remuneração pelos serviços prestados aos seus clientes.

Para orientar devidamente as partes envolvidas em litígios e os operadores do direito, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Agravo Interno no Recurso Especial 1.834.777/CE, sob a arguta relatoria do Ministro Cueva, estabeleceu que o marco inicial para a aplicação das regras de fixação dos honorários advocatícios, incluindo a unificação dos critérios independentemente da natureza da decisão, é a data da prolação da sentença.

De fato, a busca pela equidade e justiça - ainda que de forma capenga - permanece no epicentro das deliberações judiciais, esculpindo o panorama jurídico brasileiro. Estas transformações indicam não apenas mudanças normativas, mas também uma movimentação em direção a um sistema judiciário mais equitativo e sensível às nuanças de cada caso.

Em última análise, a equidade permanece no cerne da evolução do direito no Brasil, iluminando tanto a mente dos magistrados quanto a balança da justiça, ainda que ambos pareçam meio “enferrujados” às vezes.


A complexidade da aplicação da multa por agravo interno (artigo 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil)

Dentro do intrincado contexto do sistema judiciário brasileiro, a interpretação e aplicação do artigo 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil de 2015, que trata da multa por agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente, têm sido objeto de acirrados debates e análises aprofundadas nos Tribunais Superiores, especialmente no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).

Recentemente, o STJ, por meio de sua Corte Especial, selecionou um conjunto de Recursos Especiais (nºs 2.043.826, 2.043.887, 2.044.143 e 2.006.910) para análise sob o procedimento dos repetitivos, com o objetivo de estabelecer orientações claras e uniformes sobre a aplicação da penalidade em questão.

O tema submetido a julgamento, registrado como Tema nº 1.201 na base de dados do Colendo Superior Tribunal Justiça, aborda a:

"aplicabilidade da multa prevista no parágrafo 4º do artigo 1.021 do Código de Processo Civil (CPC) quando o acórdão recorrido fundamenta-se em precedente qualificado (artigo 927, III, do CPC)."[Questão submetida a julgamento]

Bem como a:

"possibilidade de considerar manifestamente inadmissível ou improcedente (mesmo em votação unânime) o agravo interno cujas razões apontam para a indevida ou incorreta aplicação de tese firmada em sede de precedente qualificado". [Questão submetida a julgamento]

Essa medida foi adotada como resposta à complexidade do tema, especialmente considerando que diferentes colegiados têm adotado interpretações variadas em relação à imposição da multa ao longo dos anos.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, tem consolidado o entendimento de que a utilização indevida dos recursos, principalmente quando empregados de forma protelatória ou manifestamente inadmissível, caracteriza abuso do direito de recorrer, justificando, assim, a aplicação da penalidade prevista no Código de Processo Civil:

"A utilização indevida das espécies recursais, materializada na interposição de recursos manifestamente inadmissíveis, improcedentes ou contrários à jurisprudência desta Suprema Corte como mero expediente protelatório, desvirtua o próprio postulado constitucional da ampla defesa e configura abuso do direito de recorrer, ensejando a aplicação da penalidade prevista no art. 1021, § 4º, do CPC, calculada à razão de 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa." [ARE 961763 AgR/SP].

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reforçado que a aplicação da multa não é automática, demandando uma análise meticulosa e fundamentada. É imperativo verificar se o agravo interno é verdadeiramente improcedente de maneira tão evidente que sua interposição possa ser considerada abusiva ou protelatória:

"A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não sendo uma mera consequência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime. A imposição da referida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, requer que o agravo interno se revele manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja tão flagrante que a simples interposição do recurso possa ser considerada, de imediato, como abusiva ou protelatória, o que, contudo, não ocorreu no caso em questão." [AgInt nos EREsp 1120356/RS].

Além disso, recentes decisões da Terceira Turma do STJ e da Subseção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) têm enfatizado a importância de considerar o contexto e a fundamentação específica de cada caso antes de impor tal penalidade:

"A aplicação da penalidade não é uma mera decorrência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime." [AREsp 1.616.329/SP].

"O julgador, ao aplicar a multa, deve levar em consideração o teor das alegações da parte e da matéria recursal apresentada(…) Não é suficiente afirmar a improcedência, aplicando a multa de forma automática, sem elucidar as razões pelas quais, ao interpor o recurso, a parte agiu de maneira abusiva ou protelatória." [E-Ag-AIRR-101425-23.2016].

A divergência de entendimentos entre os tribunais reflete diretamente na prática jurídica, criando um cenário de incerteza para advogados e litigantes. A aplicação da multa pode variar significativamente dependendo do tribunal e do colegiado responsável pelo julgamento, gerando uma expectativa constante sobre qual direção será seguida em cada caso específico.

Em resumo, a aplicação da multa por agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente é um tema complexo e multifacetado, cuja resolução exige não apenas uma interpretação meticulosa do texto legal, mas também uma análise contextual e fundamentada de cada situação.

A uniformização dos entendimentos nos tribunais superiores torna-se crucial para proporcionar segurança jurídica e assegurar a justiça no sistema judiciário brasileiro.

Somente por meio de uma abordagem cuidadosa e harmonizada será possível tratar adequadamente a complexidade desse tema, garantindo a confiança das partes envolvidas no sistema judicial do país.


A Reconstrução dos Direitos Trabalhistas:  Formas Alternativas de Emprego Reconhecidas pelo STF (“Pejotização”)

Analisando a recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos autos do Recurso Extraordinário nº 958252, que estabeleceu que trabalhadores contratados por meio de "pessoas jurídicas" não podem questionar a legalidade da contratação na Justiça do Trabalho, nota-se o marco de uma mudança significativa no cenário jurídico-trabalhista brasileiro.

 

A fundamentação subjacente a essa decisão reside na interpretação do artigo 114, da Constituição Federal, que confere à Justiça do Trabalho a competência para julgar as medidas judiciais decorrentes da relação de trabalho. Neste contexto, a Suprema Corte entendeu que contratos civis celebrados por trabalhadores possuem presunção de validade que apenas a Justiça Comum poderia afastar, vez que a matéria é de sua competência.

 

No cerne do direito trabalhista, conforme delineado no artigo 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), repousa o princípio da primazia da realidade sobre a forma e, em seu artigo 9º, estabelece a nulidade de atos que visem fraudar os direitos trabalhistas.

 

Contudo, a decisão do STF introduz uma dinâmica diferente, ao conferir maior legitimidade à “pejotização”. Essa mudança paradigmática, embora tenha gerado controvérsias, também abre espaço para uma reinterpretação dos princípios trabalhistas à luz das necessidades contemporâneas.

 

A “pejotização”, muitas vezes vista como uma prática questionável, emerge agora como uma estratégia legítima para as empresas. Ao facilitar a contratação por meio de pessoas jurídicas, a decisão do STF proporciona uma flexibilidade contratual que pode se alinhar mais eficazmente às necessidades e à dinâmica do mercado de trabalho contemporâneo.

 

Nesse cenário, as empresas se veem diante de uma oportunidade de reestruturar suas relações laborais de maneira mais condizente com a agilidade e a versatilidade exigidas pelos tempos atuais.

 

Além disso, é importante observar que, segundo uma nova Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) do IBGE, as possibilidades de trabalho para pessoas jurídicas muitas vezes se assemelham às dos empregados celetistas. Isso pode indicar uma mudança na dinâmica do mercado de trabalho, onde a "pejotização" está sendo considerada uma opção viável para muitos profissionais, especialmente em um cenário pós-pandêmico.

 

A capacidade de contratar profissionais por meio de pessoas jurídicas proporciona uma margem significativa para a inovação contratual, ao mesmo tempo em que garante uma maior autonomia aos trabalhadores.

 

Ao adotar a “pejotização” como uma estratégia de contratação, as empresas podem estabelecer relações contratuais mais adaptáveis às suas necessidades operacionais, sem comprometer a segurança jurídica.

 

Em um contexto global em que a agilidade e a inovação são cruciais para a competitividade das empresas, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) surge como um catalisador para uma revisão profunda das práticas laborais.

 

A “pejotização”, quando vista dentro de parâmetros éticos e legais, representa um avanço na maneira como as empresas encaram a gestão de pessoal. Ela não apenas reflete a adaptação necessária às complexidades do mercado contemporâneo, mas também oferece uma oportunidade para uma abordagem mais dinâmica e eficiente nas relações laborais.

 

Diante dessa nova perspectiva proporcionada pela decisão do STF, as empresas podem abraçar a “pejotização” como uma ferramenta estratégica para aprimorar suas operações, promovendo um ambiente mais dinâmico e colaborativo entre empregadores e trabalhadores.

 

Ao fazê-lo, estarão não apenas em conformidade com as recentes diretrizes jurisprudenciais, mas também contribuindo para um modelo mais ágil e resiliente de mercado de trabalho, em consonância com as demandas da era contemporânea.


Conheça Luís Roberto Barroso, atual Presidente do Supremo Tribunal Federal

Luís Roberto Barroso é o atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ele sucede a Ministra Rosa Weber, que se aposentou compulsoriamente ao completar 75 anos, idade limite para permanecer no Tribunal.

 

Essa transição de liderança é significativa, pois o presidente do STF tem o poder de definir a Pauta de Julgamentos do Plenário Físico do Tribunal, o que influencia diretamente os temas a serem apreciados.

 

Seu legado como Presidente será determinado pelo seu desempenho e pelas decisões tomadas ao longo de seu mandato.

 

Até o presente momento, a carreira de Barroso foi marcada por formações acadêmicas sólidas e uma série de destaques tanto na advocacia quanto no magistério.

 

  • Trajetória Acadêmica e Início da Carreira Jurídica

 

Luís Roberto Barroso, nascido na cidade de Vassouras, cresceu no Rio de Janeiro, onde sua família se estabeleceu após migrar da Grécia. Seus antecedentes familiares estão vinculados ao movimento sionista em Montevidéu, onde sua mãe desempenhou um papel ativo quando jovem. Seu pai era Promotor de Justiça, enquanto sua mãe era advogada, criando um ambiente propício para o desenvolvimento de seu interesse pelo direito desde cedo.

 

Barroso concluiu seu bacharelado em direito na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em 1980. Antes de se dedicar inteiramente ao direito, cursou administração e economia na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) por dois anos e meio. Durante seus anos de graduação em direito na UERJ, ele se destacou no movimento estudantil e foi um dos fundadores do Centro Acadêmico Luiz Carpenter.

 

Após a graduação, Barroso continuou a fortalecer sua formação acadêmica, obtendo mestrado (Master of Laws) na prestigiosa Yale Law School, nos Estados Unidos, em 1989. Ele prosseguiu com seus estudos, concluindo seu doutorado na UERJ em 2008. Sua dedicação à pesquisa e à academia é evidente em seu currículo, que inclui um período de pós-doutorado na Universidade de Harvard, em 2011.

 

Barroso concentra-se principalmente no estudo do direito público, com especialização em teoria constitucional, direito constitucional contemporâneo, interpretação constitucional, controle de constitucionalidade, direito constitucional econômico, administrativo e regulação.

 

É professor na Faculdade de Direito da UERJ desde 1995, professor visitante na Universidade de Brasília desde 2009, e já lecionou em algumas das mais prestigiadas universidades internacionais, como a New York University School of Law e a London School of Economics. Sua notável trajetória o consolida como uma figura de destaque no cenário jurídico brasileiro e internacional.

 

  • Atuação como Jurista e Advogado, Antes de Chegar ao STF

 

Antes de sua nomeação para o STF, Barroso desempenhou papel de destaque como advogado e jurista. Sua atuação em casos de grande relevância, como o reconhecimento das uniões homoafetivas, demonstrou sua habilidade em argumentar em prol de questões sociais e de direitos humanos.

 

A exempli gratia, colecionasse a atuação do Ministro Luís Roberto Barroso no histórico julgamento das ADI 4277 e ADPF 132.

 

Nesse contexto, Barroso, entre outros Ministros, fundamentou sua posição no "direito à busca da felicidade", um princípio que, segundo ele, decorre diretamente do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Essa decisão histórica marcou não apenas a equiparação legal das uniões homoafetivas, mas também estabeleceu um importante precedente para futuros casos relacionados aos direitos da comunidade LGBTQIA+ no Brasil.

 

Desde então, o STF tem invocado o princípio da busca pela felicidade em várias decisões que promovem a igualdade de gênero, a liberdade de orientação sexual e a proteção dos direitos humanos.

 

 

Não sendo suficiente, Barroso também atuou na defesa das pesquisas com células-tronco embrionárias, a interrupção da gestação de fetos anencefálicos e a proibição do nepotismo no Poder Judiciário. Também representou o militante Cesare Battisti em um caso internacionalmente conhecido, onde Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália por quatro homicídios.

 

Seu escritório de advocacia ganhou destaque como um dos mais importantes do país, solidificando ainda mais sua posição como uma figura de destaque no cenário jurídico.

 

  • Uma Década de Ascensão no STF e no TSE

 

Luís Roberto Barroso ingressou no STF em 2013, nomeado pela então presidente Dilma Rousseff (PT). Ele assumiu a cadeira deixada por Carlos Ayres Britto e compartilhou a Corte com notáveis Ministros.

 

Envolvido em temas polêmicos, Barroso foi relator medida judicial a respeito da Articulação dos Povos Indígenas, em que determinou que o governo de Jair Bolsonaro, Presidente à época, tomasse medidas necessárias para proteger as comunidades indígenas durante a pandemia da Covid-19. Da mesma forma, durante a pandemia, ele ordenou a suspensão de medidas que resultassem em despejos, desocupações ou reintegrações de posse em áreas habitadas por populações vulneráveis.

 

Barroso também desempenhou um papel fundamental na decisão de instaurar a CPI da Covid no Senado, que investigou a gestão do governo Bolsonaro durante a pandemia. Ele considerou que a criação de CPIs no Congresso é um direito da minoria, desde que atenda aos requisitos constitucionais.

 

  • A Personalidade de Barroso e seu Legado

 

A personalidade de Luís Roberto Barroso é marcada por uma retórica direta e polêmica. Isso foi evidenciado quando respondeu a um manifestante com a frase "perdeu, mané, não amola" durante um questionamento sobre a segurança das urnas eletrônicas brasileiras. Suas declarações públicas, como "nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia", frequentemente geraram controvérsias.

 

Entre os casos notórios, Barroso assumiu um papel importante no julgamento da Ação Penal (AP) 470 (o caso do Mensalão), após o Ministro Joaquim Barbosa, então relator, se aposentar. Ele ficou encarregado de decisões sobre cumprimento de penas, progressão de regime, direito ao trabalho externo e pedidos de prisão domiciliar.

 

Além disso, Barroso foi autor de uma questão de ordem que restringiu o foro privilegiado de parlamentares a processos relacionados a crimes ocorridos durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo parlamentar.

 

Ele também suspendeu uma Lei Municipal em Londrina, Estado do Paraná, que proibia debates e abordagens sobre gênero nas escolas, argumentando que isso viola o princípio da dignidade humana e que a educação deve servir para reduzir a intolerância.

 

O legado de Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal é marcado por sua atuação firme na defesa dos direitos humanos, da igualdade e da democracia no Brasil. Isso o torna uma figura proeminente no cenário jurídico do país, amplamente respeitado internacionalmente.

 

  • O Futuro com Barroso à Frente do STF

 

Sua gestão como presidente do Supremo Tribunal Federal promete enfoque na segurança jurídica, no combate à pobreza, no desenvolvimento sustentável, na promoção da educação básica, ciência e tecnologia, bem como a habitação popular.

 

Espera-se que sua presidência se conduza a uma Pauta de Julgamentos influenciada por seu histórico de defesa dos direitos humanos e sua dedicação à proteção dos grupos mais vulneráveis da sociedade.

 

Com uma longa lista de casos notáveis em sua carreira no STF, abrangendo temas como a validade da contribuição sindical, a descriminalização do consumo pessoal de drogas e o aborto nos primeiros três meses de gestação, o Ministro Barroso assume a presidência do STF com a promessa de liderar a mais alta instância do sistema jurídico brasileiro com determinação e foco em questões cruciais para a sociedade e a democracia.

 

 

Sua nomeação como presidente do STF em setembro de 2023 marca o ápice de sua carreira no Tribunal e o desafio de liderar a mais alta instância judicial do Brasil em um momento crítico da política e da sociedade brasileira.

 

Aguardemos agora para ver como sua liderança moldará o futuro da justiça no Brasil.