Corrupção entre sócios? Quais os riscos? Como proceder?


11 de dezembro de 2023By João Pedro Gois

A presença de um sócio corrupto numa sociedade empresarial é um turbilhão que agita as águas da governança corporativa e da ética empresarial, exigindo uma resposta jurídica e estratégica bem articulada. A posição do sócio corrupto, seja como controlador, influente ou minoritário, desempenha um papel crucial na determinação da extensão do dano e na estratégia de resposta da empresa.

 

A influência deste sócio pode alterar significativamente a dinâmica interna e as operações da empresa, impondo riscos não apenas financeiros, mas também reputacionais.

 

Sob a égide da legislação brasileira, especificamente a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992) e a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), a empresa enfrenta responsabilidades legais diretas pelos seus atos, preconizando, a responsabilidade objetiva da sociedade, sujeitando-a a penalidades que incluem multas pesadas e restrições operacionais.

 

Essas normativas são pedras angulares na luta contra a corrupção institucional, levantando a importância da integridade nas operações comerciais e na administração pública.

 

Além das implicações corporativas, o Código Penal Brasileiro oferece uma perspectiva punitiva para os sócios envolvidos em práticas corruptas com/contra a União Federal. Delitos como tráfico de influência, descaminho e corrupção ativacrimes praticados em benefício próprio mas em desfavor do Estado, tendo o agente público como mecanismo para o ato – delineados nos artigos 331, 332 e 333, podem levar a sanções severas, incluindo penas de prisão e multas, sublinhando a seriedade com que o sistema jurídico brasileiro aborda a corrupção no ambiente jurídico funcional. Confira-se:

 

“Art. 331 – Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena – detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.” Tráfico de Influência

 

Art. 332 – Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função: (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995) Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995) Parágrafo único – A pena é aumentada da metade, se o agente alega ou insinua que a vantagem é também destinada ao funcionário. (Redação dada pela Lei nº 9.127, de 1995).” Corrupção ativa

 

Art. 333 – Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003) Parágrafo único – A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.” Descaminho

 

Destarte, quando a permanência do sócio corrupto se torna insustentável, a empresa pode recorrer a diversas estratégias para resolver o conflito. Entre elas encontra-se a figura do distrato consensual, a saída motivada ou a exclusão do sócio, seguindo os procedimentos estabelecidos no Código Civil, notadamente nos artigos 1.004, 1.030 e 1.085. Veja-se:

 

“Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta pelo dano emergente da mora. Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art. 1.031.

 

Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.

 

Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa. Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa. (Redação dada pela Lei nº 13.792, de 2019)”

 

Estas ações precisam ser conduzidas com prudência, garantindo que os direitos dos sócios permanecentes sejam respeitados, afinal, se afere por óbvio que um sócio ardiloso, capaz de sobrepor seus interesses aos da entidade jurídica de direito privado, continuará implementando seus atos clandestinos durante o devido processo jurídico.

 

Sincronicamente, a responsabilização do sócio pelos danos causados é um aspecto que não pode ser esquecido. A empresa pode buscar indenizações por meio de ações de responsabilidade civil para recuperar perdas financeiras e reparar danos à sua imagem e credibilidade, não apenas buscando justiça, mas também implementando um dissuasor para futuras práticas corruptas.

 

Ligado a isto, a proteção dos interesses dos investidores e a transparência nas operações são fundamentais, especialmente em contextos onde informações sobre práticas corruptas são ocultadas. As normas da Comissão de Valores Mobiliários, especialmente a Instrução nº 358[1], enfatizam a necessidade de divulgação honesta e completa de informações aos investidores e ao mercado.

 

Por fim, vale ainda destacar, a readequação sofrida pela teoria Ultra Vires Societatis[2], embora histórica, encontra limitações no contexto atual, especialmente após alterações legislativas significativas. As mudanças refletem a evolução do direito brasileiro no que tange à responsabilidade empresarial e à proteção de terceiros o contexto atual prioriza a rápida reparação aos terceiros antes da discussão sobre a imputação da responsabilidade pelo ato – indicando um afastamento desta teoria em favor de uma abordagem mais pragmática e responsável.

 

Neste cenário, a empresa deve estar preparada para um confronto legal e estratégico com o sócio corrupto. Além de ações judiciais para sua exclusão e recuperação de ativos, a empresa deve adotar medidas preventivas como sistemas robustos de compliance, auditorias regulares e uma política de transparência. Estas medidas são essenciais para a detecção precoce de práticas corruptas e a implementação de correções eficazes.

 

Finalmente, mas não menos importante, é preciso cultivar uma cultura corporativa que valorize a ética e a integridade. Programas de educação e treinamento para funcionários e gestores são fundamentais para reforçar os bons costumes dentro da instituição e demonstrar as consequências dos atos ilícitos se forem praticados.

 

Lembrem-se, in perpetuum, que a corrupção age como um verme, de forma insidiosa, suga a vitalidade da empresa sem se revelar, operando na clandestinidade e tornando-se aparente apenas quando o estrago já está consumado. Frequentemente, é o elemento que impede o progresso da instituição, iniciando um processo de regressão silenciosa e destrutiva.

 

[1]Instrução nº 358 – Dispõe sobre a divulgação e uso de informações sobre ato ou fato relevante relativo às companhias abertas, disciplina a divulgação de informações na negociação de valores mobiliários e na aquisição de lote significativo de ações de emissão de companhia aberta, estabelece vedações e condições para a negociação de ações

[2]A teoria Ultra Vires Societatis dispõe que se o administrador, ao praticar atos de gestão, violar o objeto social delimitado no ato constitutivo, esse ato não poderá ser imputado à sociedade. O objeto social, por sua vez, delimita o ramo de atividade da sociedade.